quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Carta aberta aos alunos do 12º ano


Moreira da Maia, 29 de outubro de 2019

Caros ex-alunos do 12º ano de escolaridade:

Poderão achar estranha esta minha missiva, sobretudo numa altura em que já não vos acompanho como docente. Mas será, alguma vez, possível um (a) professor (a) esquecer-se dos que, um dia, foram seus alunos, ainda que tenham sido entregues a uma docente sensível às vossas preocupações e anseios mais profundos?
Na sexta feira passada, falamos de vós e da forma como sentem o estudo do nosso poeta Fernando Pessoa. Vou contar-vos um segredo: Não raras vezes os professores, em conjunto, refletem sobre qual será a maneira mais eficaz de chegar até vós, de vos sensibilizar para o estudo de determinadas matérias que poderão considerar “áridas”.
Quero que saibam que tenho guardado no coração todos os rostos embevecidos, não apenas pelos conhecimentos que vos transmiti, reflexo da vossa imensa sensibilidade pelo mundo, mas também pelo facto de termos vivido, juntos, momentos únicos que me fazem recordar, com saudade, a forma prazerosa como muitos de vós me escutavam e se abstraiam de tudo o que vos rodeava. Lembro-me, ainda, com muita saudade, do tempo em que vi muitos de vós a representar peças de teatro e da forma como se exprimiam ao falar das palavras cor de rosa e das palavras cinzentas, aquele belo texto de Sophie Caroquei.
Creio, firmemente, que guardarão, como eu, esses momentos únicos e essas palavras melífluas que proferiram e encantaram os que tiveram o privilégio de as poderem ouvir.
Conheço-vos bem. Sei que são brilhantes em tudo o que fazem e que facilmente ficam fascinados pela Literatura e pela poesia. Quero, pois, pedir-vos que pesquisem a entrevista a Pedro Lamares, ator sobejamente conhecido e que o oiçam declamar poesia de Fernando Pessoa. Vão ver que é um assombro! Certamente que ele, como ninguém, conseguirá despertar em vós o gosto por esse grande poeta e patriota que considerava ser a sua pátria a língua portuguesa. Dizia, ainda, “Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”.
Hoje, quero que sejais vós a sonhar com as “palavras cor de rosa” de Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de Campos (heterónimos pessoanos) e com o próprio Fernando Pessoa (ortónimo).
Quero que saibam que é natural, num primeiro momento, que vos possa causar alguma estranheza e desalento (tudo isso faz parte do processo de ensino/ aprendizagem), mas lembrem-se que, como muitas coisas na vida, primeiro estranham-se, depois entranham-se.
Por fim, quero dizer-vos que me sinto honrada por ter partilhado convosco a minha incipiente sabedoria e que, no mais fundo de mim, sei que continuarão a ser estrelas mágicas, cintilantes e cadentes no mar revolto da vida.
Desejando, com ardor, que as ondas desse mar salgado levem para longe a aridez e vos traga o rendilhado da espuma e a magia que a mesma opera em nós, quando a tentamos saborear, ainda que ao de leve…
Abraço-vos a todos, como em cada Natal, quando contemplo a árvore rodeada de presentes e vejo nela as melhores dádivas que a vida me deu: os que se cruzaram comigo no peregrinar da vida, oferecendo-os ao Menino Jesus, Estrela Maior que me guia desde o meu nascimento e ao qual peço que vos guie também em cada momento das vossas vidas.

Sempre ao vosso dispor,

 Prof. Conceição Pires

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