Moreira da Maia, 29 de outubro de 2019
Caros ex-alunos do 12º
ano de escolaridade:
Poderão achar estranha esta
minha missiva, sobretudo numa altura em que já não vos acompanho como docente.
Mas será, alguma vez, possível um (a) professor (a) esquecer-se dos que, um dia,
foram seus alunos, ainda que tenham sido entregues a uma docente sensível às
vossas preocupações e anseios mais profundos?
Na sexta feira passada, falamos
de vós e da forma como sentem o estudo do nosso poeta Fernando Pessoa. Vou
contar-vos um segredo: Não raras vezes os professores, em conjunto, refletem
sobre qual será a maneira mais eficaz de chegar até vós, de vos sensibilizar
para o estudo de determinadas matérias que poderão considerar “áridas”.
Quero que saibam que tenho
guardado no coração todos os rostos embevecidos, não apenas pelos conhecimentos
que vos transmiti, reflexo da vossa imensa sensibilidade pelo mundo, mas também
pelo facto de termos vivido, juntos, momentos únicos que me fazem recordar, com
saudade, a forma prazerosa como muitos de vós me escutavam e se abstraiam de
tudo o que vos rodeava. Lembro-me, ainda, com muita saudade, do tempo em que vi
muitos de vós a representar peças de teatro e da forma como se exprimiam ao
falar das palavras cor de rosa e das palavras cinzentas, aquele belo texto de Sophie
Caroquei.
Creio, firmemente, que
guardarão, como eu, esses momentos únicos e essas palavras melífluas que
proferiram e encantaram os que tiveram o privilégio de as poderem ouvir.
Conheço-vos bem. Sei que são
brilhantes em tudo o que fazem e que facilmente ficam fascinados pela Literatura
e pela poesia. Quero, pois, pedir-vos que pesquisem a entrevista a Pedro
Lamares, ator sobejamente conhecido e que o oiçam declamar poesia de Fernando
Pessoa. Vão ver que é um assombro! Certamente que ele, como ninguém, conseguirá
despertar em vós o gosto por esse grande poeta e patriota que considerava ser a
sua pátria a língua portuguesa. Dizia, ainda, “Deus quer, o homem sonha, a obra
nasce”.
Hoje, quero que sejais vós a
sonhar com as “palavras cor de rosa” de Alberto Caeiro, Ricardo Reis, Álvaro de
Campos (heterónimos pessoanos) e com o próprio Fernando Pessoa (ortónimo).
Quero que saibam que é natural,
num primeiro momento, que vos possa causar alguma estranheza e desalento (tudo
isso faz parte do processo de ensino/ aprendizagem), mas lembrem-se que, como
muitas coisas na vida, primeiro estranham-se, depois entranham-se.
Por fim, quero dizer-vos que me
sinto honrada por ter partilhado convosco a minha incipiente sabedoria e que,
no mais fundo de mim, sei que continuarão a ser estrelas mágicas, cintilantes e
cadentes no mar revolto da vida.
Desejando, com ardor, que as
ondas desse mar salgado levem para longe a aridez e vos traga o rendilhado da
espuma e a magia que a mesma opera em nós, quando a tentamos saborear, ainda
que ao de leve…
Abraço-vos a todos, como em
cada Natal, quando contemplo a árvore rodeada de presentes e vejo nela as
melhores dádivas que a vida me deu: os que se cruzaram comigo no peregrinar da
vida, oferecendo-os ao Menino Jesus, Estrela Maior que me guia desde o meu
nascimento e ao qual peço que vos guie também em cada momento das vossas vidas.
Sempre ao vosso dispor,
Prof. Conceição Pires
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